Simples e complicado - Jornal Cruzeiro do Vale

Simples e complicado

16/10/2012 09:11

Fui à Grécia cumprir meu tributo aos gregos. Lá encontro os momentos inaugurais do que a historiografia chama de Tradição Ocidental. Meus destinos mais pretendidos eram dois. Fui ao lugar onde Dionísio veio ensinar a humanidade sobre coisas dos prazeres. Aí estive como festa. E visitei um despenhadeiro chamado Termópilas. Neste meio do nada, só, entranhado no mato, fiz minhas reverências a Leônidas I de Esparta. Compenetrado, agradeci-lhe pela civilização que me constitui como humano.

Trezentos mil persas chefiados por Xerxes I vinham em vingança, com pretensões de tomar a toda a Grécia. Sete mil gregos foram enfrentá-los. A maioria combateu no estreito de Artemísio. Em Termópilas, um ponto estratégico, contudo, fincaram-se setecentos téspios, quatrocentos tebanos e trezentos espartanos. Leônidas comandou-os em resistência por três dias. Foi tempo bastante para os gregos se organizarem e vencerem os persas, bem mais tarde, em Salamina e Plateias.

Isso ocorreu há dois mil e quinhentos anos. Um século e meio depois os macedônios dominaram os gregos, mas a cultura grega subsistiu e desenvolveu-se. Mais dois séculos e os romanos tomaram o controle da Macedônia e da Grécia. A civilização grega, contudo, emprenhou as instituições romanas. Roma era o mundo. Há 17 séculos, após muita glória e muitos desmandos, o Império Romano viu Constantino tornar-se seu imperador. Constantino fundou a igreja católica.

Há 16 séculos começou a Idade Média: retrocesso social, ignorância, superstições, penúria, doenças, perseguições e guerras religiosas. A igreja católica presidiu absoluta o assassinato de cada dissidente e a morte de todas as ideias. Há sete séculos o obscurantismo católico foi levemente tocado pelo Renascimento e reagiu com o recrudescimento possível de violência. Há três séculos os pensadores iluministas começaram a pôr luzes nas trevas que regravam o poder e os detalhes da vida social.

A Revolução Burguesa há pouco mais de 200 anos interrompeu os assassinatos religiosos e garantiu o direito de se ter ideias e de se dizer ideias. A Razão, entretanto, não penetrou desde logo na Espanha, em Portugal e nos países que herdaram sua cultura. Por isso, talvez, há apenas cinquenta e poucos anos, no Brasil, religiosos católicos e restos da Ditadura Militar ainda impunham censura cultural. Quiçá por isso o lamentável discurso da presidenta Dilma Rousseff na ONU.
Está lá na sua fala: ?Como presidenta de um país no qual vivem milhares e milhares de brasileiros de confissão islâmica, registro neste plenário nosso mais veemente repúdio à escalada de preconceito islamofóbico em países ocidentais?. A presidenta embarcou em uma explicação insustentável: os assassinatos ideológicos de ocidentais que islâmicos vêm cometendo, amparados por discursos rancorosos e obscurantistas ? e, suspeito, de apoio logístico ? de seus governos, são responsabilidade dos EUA. Coisa nenhuma!

?Do alto de seus minaretes, os aiatolás condenam à morte estrangeiros residentes em países estrangeiros por atos cometidos em países estrangeiros e que no estrangeiro não constituem crime. Autoridades islâmicas legislam urbi et orbi e o islã pegou gosto pela abrangência de sua jurisdição.?  Editei e pluralizei o que Janer Cristaldo disse de Khomeini (FSP26set12, A3). Em verdade, embalados por fanatismos, islâmicos que vão viver em outras culturas dificilmente deixam de ouvir seus guias morais de origem.

De fato, ?Se migrantes de todos os quadrantes normalmente se adaptam à cultura europeia, há um imigrante particular que não só causa problemas na Europa como quer dominá-la culturalmente. São muçulmanos, que querem instituir no continente suas práticas, muitas vezes tipificadas como crime nas legislações nacionais? (Cristaldo). Exagero? Pensa: se encontrares uma mulher com véu por aqui, nada passará; se uma mulher for encontrada sem véu por lá, será apedrejada. Simples e complicado assim.

Esses absurdos todos são uma continuação de um antigo conflito de civilizações que se consubstanciou em guerra religiosa. Não tenho nenhuma ilusão quanto às intenções dos religiosos muçulmanos. Enquanto países ocidentais estão sendo lenientes com agressões à sua soberania, felizmente a arte, com sacrifício de artistas, segue em resistência, agora, não contra católicos, mas contra muçulmanos. Tenho, e muita gente tem, medo desses novos cruzados. Creio que isso é sinal de que Leônidas está em perigo.


Léo Rosa de Andrade
Doutor em Direito pela UFSC.
Psicólogo e Jornalista.
Professor da Unisul.

Edição 1432

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