Dia da Consciência Negra: comemorar ou reivindicar? - Jornal Cruzeiro do Vale

Dia da Consciência Negra: comemorar ou reivindicar?

21/11/2014

photographyofheadshotofblackman142GG.jpgPor Thiago Moraes

Mesmo depois de 126 anos da Abolição da Escravatura, o Brasil tem continuado a debater ações que assegurem a igualdade racial. Celebrado nesta quinta-feira, dia 20, o Dia da Consciência Negra tem trazido reflexão sobre a inserção dos negros em diversos segmentos da sociedade. Em Gaspar, o diálogo sobre a data especial traz diversidade de opiniões entre moradores que têm feito parte da história do município.

Integrante do grupo de Gaspar Afro Raízes do Vale, Luis Carlos Rodrigues do Santos, ao lado de mais 19 membros, tem levantado dados históricos da participação dos negros na formação e construção da sociedade gasparense. Morador da localidade Sertão Verde e agente de saúde que combate as doenças de endemia, como dengue, Luis Carlos aponta que o grupo, existente há um ano e oito meses, tem trazido uma reflexão mais impactante sobre as demandas da participação dos negros no município. 

De acordo com Luis Carlos, embora ainda se tenha pontos para evoluir na questão da inclusão social dos negros na sociedade gasparense, atualmente os negros vêm ocupando alguns cargos de destaque em empresas de grande porte. ?Precisamos continuar lutando para deixarmos, cada vez mais, de ser invisíveis aos olhos dos outros. Uma das missões do grupo é trazer autoestima aos mais de 5 mil negros e pardos gasparenses. Estamos nos posicionando para subir mais degraus na escala social e profissional em Gaspar?, ressalta.

Amigo e um dos integrantes do grupo, Calisto Lopes Cerqueira, morador desde 1985 de Gaspar, no bairro Gasparinho, tem percebido uma evolução no tratamento com os negros. ?A convivência tem sido normal, tanto nos aspectos sociais e profissionais?, conta Calisto, que trabalha há oito anos na pasta da Assistência Social do município.

mg8043GG.jpg Luis Carlos Rodrigues dos Santos, ao lado de 19 membros, tem levantado dados históricos da participação dos negros na formação e construção da sociedade gasparense.


Haitianos em Gaspar


De acordo com o grupo de Gaspar Afro Raízes do Vale, existem hoje em Gaspar aproximadamente 300 haitianos, sendo que 20 deles já estão com famílias estabelecidas em Gaspar, inclusive com casamentos já realizados entre haitianos e gasparenses. ?Já houve nascimento de uma criança de um haitiano com uma gasparense no hospital de Gaspar. As empresas no município estão aproveitando a mão de obra deles em diversos setores. Eles estão espalhados pelos bairros de Gaspar e precisam ser respeitados e acolhidos, pois vieram para o Brasil devido a conflitos sociais gravíssimos?, opina.

Piadas preconceituosas e a integração pelo esporte

mg8118GG.jpgLeonardo Clemente reside em Gaspar há 25 anos e acredita que não se deveria fechar os olhos para a luta dos antepassados. ?No dia a dia não tem como passar ileso a situações às vezes constrangedoras, como piadas de mau gosto e ditados grosseiros e preconceituosos.

Leonardo participa de um jogo de futebol de confraternização entre amigos negros e brancos. É o clássico Pretos contra Brancos, realizado na Sociedade Gasparense, no Coloninha, em dezembro. ?Em todos os anos, barreiras entre amigos e conhecidos das duas etnias têm sido quebradas por meio de uma simples partida de futebol. Nunca houve confusão em nossas partidas?, conta Leonardo, que é um dos 50 integrantes do time dos negros.

Dívida social

Cícero Amaro, suplente de vereador na Câmara, ressalta que a data serve para frisar que os negros ainda necessitam alcançar condições igualitárias em relação às outras etnias. ?A data traz reflexão. Porém, é preciso lembrar que os negros em Gaspar, em sua maioria, ocupam funções operacionais, de chão de fábrica. As cotas para os negros e pardos nas universidades e em concursos públicos federais são um avanço a ser colhido em médio e em longo prazo. No Brasil, há uma dívida social com os negros?, afirma.

Escola faz trabalho de conscientização

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Alunos do Ensino Médio da Escola Frei Godofredo desenvolveram um trabalho interdisciplinar sobre consciência negra desde o início do ano letivo. O resultado da força-tarefa está sendo uma exposição sobre temas relevantes envolvendo os negros.

Expostos no pátio da escola, cartazes e materiais de arte criados pelos próprios alunos chamam a atenção de quem passa pelo espaço. Distribuídos em quadros e mesas, retratos de personagens negros que se destacaram na humanidade foram expostos, assim como a aspectos da cultura negra, além de objetos de arte de pintura de máscaras.       

O projeto faz parte do curso que os professores participam, do Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio. Com abordagens sobre violência, cidadania e movimentos sociais, a professora de artes Ângela Maria Rosa Custódio foi uma das idealizadoras do projeto, assim como os professores de Sociologia e História, Renato Jesuíno Cancelier Fuck e Bento José do Nascimento respectivamente. Outros professores, como das disciplinas de Português, Matemática e Geografia, participaram da pesquisa. ?O que chamou a atenção foi uma pesquisa que fizemos, em que foi apontado que 13% de alunos que se disseram racistas?, aponta Renato, surpreso com o índice.

De acordo Renato, os temas colocados na pauta para a discussão entre os alunos acenderam o diálogo e a reflexão sobre os reflexos do preconceito racial na sociedade. ?Os alunos debateram, argumentaram. A experiência tem sido excelente, proveitosa, houve aulas que só foi possível dialogar sobre um dos temas, tamanha participação dos alunos?, conta Renato.

Alunos haitianos

De acordo com a diretora da Escola Frei Godofredo, Viviana Maria Schmitt dos Santos, 10% dos alunos do colégio são negros, e hoje existem três alunos haitianos. ?A convivência com os estudantes haitianos tem sido muito boa. Os professores têm sabido lidar com a cultura deles, estamos nos aperfeiçoando. Com relação ao projeto interdisciplinar, só tenho palavras de agradecimento a todos os professores e aos alunos que fizeram um trabalho que resultou em uma exposição referência sobre a importante discussão da consciência negra?, avalia Viviana.

 

Edição 1642
 

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